quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A Cólera

O Orgulho vos induz a julgar-vos mais do que sois; a não suportardes uma comparação que vos possa rebaixar; a vos considerardes, ao contrário, tão acima dos vossos irmãos, quer em espírito, quer em posição social, quer mesmo em vantagens pessoais, que ao menor paralelo vos irrita e aborrece. Que sucede então? – Entregais-vos à cólera.

Pesquisai a origem desses acessos de demência passageira que vos assemelham ao bruto, fazendo-vos perder o sangue-frio e a razão; pesquisai e, quase sempre, deparareis com o orgulho ferido. Que é o que vos faz repelir, coléricos, os mais ponderados conselhos, senão o orgulho ferido por uma contradição? Até mesmo as impaciências, que se originam de contrariedades muitas vezes pueris, decorrem da importância que cada um liga à sua personalidade, diante da qual entende que todos se devem dobrar.

Em seu frenesi, o homem colérico a tudo se atira: à natureza bruta, aos objetos inanimados, quebrando-os porque lhe não o obedecem. Ah! Se nesses momentos pudesse ele observar-se a sangue-frio, ou teria medo de si próprio, ou bem ridículo se acharia! Imagine ele por ai que impressão produzirá nos outros. Quando não fosse pelo respeito que deve a si mesmo, cumpria-lhe esforçar-se por vencer um pendor que o torna objeto de piedade.

Se ponderasse que a cólera nada remedeia, que lhe altera a saúde e compromete até ávida, reconheceria ser ele próprio a sua primeira vítima. Mas, outra consideração, sobretudo, deveria conte-lo, a de que torna infelizes todos os que cercam. Se tem coração, não lhe será motivo de remorso fazer que sofram os entes a quem mais ama? E que pesar mortal se, num acesso de fúria, praticasse um ato que houvesse de deplorar toda a sua vida!

Em suma, a cólera não exclui certas qualidades do coração, mas impede se faça muito bem e pode levar a prática de muito mal. Isto deve bastar para induzir o homem a esforçar-se para dominar. O Espírita, ao demais, é concitado a isso por outro motivo; o de que a cólera é contrária à caridade e à humildade cristãs. – Um espírito protetor – (Bordéus, 1863.)

Segundo a idéia falsíssima de que lhe não é possível reformar a sua própria natureza, o homem se julga dispensado de empregar esforços para se corrigir dos defeitos em que de boa-vontade se compraz, ou que exigiriam muita perseverança para serem extirpados. É assim, por exemplo, que o indivíduo, propenso a encolerizar-se, quase sempre se desculpa com o seu temperamento. Em vez de se confessar culpado, lança culpa em seu organismo, acusando a Deus, dessa forma, as suas próprias faltas. É ainda uma conseqüência do orgulho que se encontra de permeio a todas as suas imperfeições.

Indubitavelmente, temperamentos há que se prestam mais que outros a atos violentos, como há músculos mais flexíveis que se prestam melhor aos atos de força. Não acrediteis, porém, que aí resida a causa primordial da cólera e persuadi-vos de que um Espírito pacífico, ainda que num corpo bilioso, será sempre pacífico, e que um Espírito violento, mesmo num corpo linfático, não será brando; somente, a violência tomará outro caráter.

O corpo não dá cólera àquele que não na tem, do mesmo modo que não dá os outros vícios. Todas as virtudes e todos os vícios são inerentes ao Espírito.

Texto pinçado do livro: Evangelho segundo o Espiritismo (Allan Kardec)
Foto ilustrativa

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Desigualdade das riquezas.













A desigualdade das riquezas é um dos problemas que inutilmente se procurará resolver, desde que se considere apenas a vida atual. Por que não são igualmente ricos todos os homens? Não o são por uma razão muito simples: “Por não serem igualmente inteligentes, ativos e laboriosos para adquirir, nem sóbrios e previdentes para conservar.”

É aliás, ponto matematicamente demonstrado que a riqueza, repartida com igualdade, a cada um daria uma parcela mínima e insuficiente, que supondo efetuada essa repartição, o equilíbrio em pouco tempo estaria desfeito, e o resultado poderia ser o aniquilamento de todos os grandes trabalhos que concorrem para o progresso e para o bem estar da humanidade e tendo cada um o necessário, a motivação que impele os homens às descobertas e empreendimentos úteis, deixariam de existir.

Por que Deus concede as riquezas a pessoas que são incapazes de fazê-la frutificar para o bem de todos? A sabedoria de Deus deu ao homem o livre-arbítrio, para que distinguisse o bem do mal. A riqueza é um meio de o experimentar moralmente, ao mesmo tempo, é poderoso meio de ação para o progresso, não quer Deus que ela permaneça longo tempo improdutiva e a desloca incessantemente, e cada um tem de possuí-la, utiliza-la, e demonstrar que sabe fazer uso dela, entretanto, sendo materialmente impossível que todos, ao mesmo tempo, a possuam, pois assim sendo, ninguém trabalharia, comprometendo o melhoramento do planeta. Assim um que não tem hoje, já a teve ou terá noutra existência; outro, que agora tem, talvez não atenha amanhã.

Há ricos e pobres, porque sendo Deus justo, como é, a cada um prescreve trabalhar a seu turno. A pobreza é, para os que a sofrem, a prova da paciência e da resignação; a riqueza é, para os outros, a prova da caridade e da abnegação.

Deploram-se, com razão, o péssimo uso que alguns fazem das suas riquezas, as ignóbeis paixões que a cobiça provoca, e pergunta-se: Deus será justo dando-as a tais criaturas?

É exato que se o homem tivesse uma única existência, nada justificaria semelhante repartição dos bens da Terra, se, entretanto, se não tivermos em vista apenas a vida atual e, ao contrário, considerarmos o conjunto das existências, veremos que tudo se equilibra com justiça. Carece pois, o pobre de motivo para assim acusar a Providência, como para invejar os ricos e estes para glorificarem do que possuem.

Se abusam, não será com decretos ou leis suntuárias que se remediará o mal. As leis podem, de momento, mudar o exterior, mas não logram mudar o coração. A origem do mal reside no egoísmo e no orgulho. Os abusos de toda espécie cessarão quando os homens se regerem pela lei da caridade.

Texto pinçado do livro: Evangelho segundo o Espiritismo – Allan Kardec
Foto ilustrativa